sábado, 6 de junho de 2009

Livros da Infância

Será que "o melhor do mundo são as crianças" é o lugar comum mais verdadeiro, capaz de tocar intimamente o mais cínico dos homens?
A mim parece-me que pelo menos aos olhos da razão, que as crianças são pedras cujo tratamento que lhes damos tem uma certa influência nos adultos em que se transformam.
Neste mundo complexo, pais e educadores, não podem controlar toda a informação que chega às nossas crianças, e que também as forma. Salva-nos o olhar atento de quem, com ternura, tenta indicar aos pequenitos, o caminho mais seguro para a tranquilidade do seu espírito.
Hoje em dia, a oferta de livros infantis, é muito vasta e completa, no sentido de proporcionarem conhecimento, entretenimento e sonho aos mais novos.
Recordo aqui eu também os livros que povoaram a minha infância, como a "Anita", " As histórias do Avôzinho", "Carlota", os livros da Condessa de Ségur, não esquecendo os "Patinhas".
Que saudades de ser criança.... Beijinhos a todos.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Ornamentos

O uso da palavra é uma arte, a arte do sonho, do sentimento, da emoção, da reconciliação… uma arte relegada para o romântico pela exaltação das emoções, pelo engano dos sentidos que promove uma onda inebriante e leva as massas a um êxtase ilusório... a formatação do sentir é por vezes tão forte que nos nega a interpretação acreditada nos próprios sentidos. E não será a procura da razão que peja os nossos sentidos e nos faz navegar num vazio temeroso na procura da inteligibilidade o que nos ludibria?

Ao lugar do “poético” apenas a ficção, e por isso leio, cavalgando numa odisseia quixotesca ou num qualquer mundo de Alice e estudo as razões da ausência desse lugar, que apesar da brisa de um vulto elegante, está ainda afastado da realidade vivencial. Pelo menos traria consigo o conceito de belo, de etéreo… a poesia, num dos conhecidos sonetos de Luís de Camões.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

muda-se o ser, muda-se a confiança;

todo mundo é composto de mudança,

tomando sempre novas qualidades.

 

Continuamente vemos novidades,

diferentes em tudo da esperança;

do mal ficam as mágoas da lembrança,

e do bem (se algum houve), as saudades.

 

O tempo cobre o chão de verde manto,

que já coberto foi de neve fria,

e, emfim, converte em choro o doce canto.

 

E, afora este mudar-se cada dia,

outra mudança faz de mor espanto,

que não muda já como soía*.    

 

* usualmente

          Luís Vaz de Camões (1595 pm)

A sociedade evolui, o sentimento é perene…

La Biblioteca de Babel


"Como todos los hombres de la biblioteca, he viajado em mi juventude; he peregrinado em busca de um libro, acaso del catálogo de catálogos; ahora que mis ojos casi no pueden descifrar lo que escribo, me preparo a morrir unas pocas leguas del hexógeno em que nasci. Muerto no faltarán manos piedosas que me tiren por la baranda; mi sepultura será el are insondable: mi corpo se hundirá largamente y se corroperá y disolverá en la viento engendrado por caida, que es infinita..."(Jorge Luis Borges)

O universo de Borges sempre tão inacessível e tão apaixonante, tão longínquo e infinito, tão distante de nós, tão perto da vida.
Alberto Manguel, foi um dos muitos jovens, que leram em voz alta para Borges, sem se estabelecer uma forte relação pessoal: "Eu descobria um texto lendo-o em voz alta, enquanto Borges usava os ouvidos como outros leitores usavam os olhos para esquadrinhar uma página à procura de uma palavra, de uma frase, de um parágrafo que confirmassem um registo da memória. Durante a leitura, interrompia-me, fazendo comentários ao texto a fim de (penso eu) tomar notas mentais."
Segundo Manguel, mesmo que não significasse nada mais que um veículo de informação para Borges, sentia que o universo do escritor abafaria qualquer sentimento contraditório: "Eu sentia que era o único proprietário de uma edição cuidadosamente anotada, compilada para meu benefício exclusivo. Evidentemente que não o era; eu (como muitos outros) era apenas o seu caderno de apontamentos, um aide-mémoire de que o escritor cego necessitava para organizar as suas memórias".

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Dia de Pentecostes

Poesia de Herberto Hélder para celebrar Pentecostes, o dia em que todos os homens se entendem.


Penso que deve existir para cada um
uma só palavra que a inspiração dos povos deixasse
virgem de sentido e que,
vinda de um ponto fogoso da treva, batesse
como um raio
nos telhados de uma vida
, e o céu
com águas e astros
caísse sobre esse rosto dormente, essa fechada
exaltação.

Que palavra seria, ignoro. O nome talvez

de um instrumento antigo, um nome ligado
à morte – veneno, punhal, rio
bárbaro onde
os afogados aparecem cegamente abraçados a enormes
luas impassíveis.

Um abstracto nome de mulher ou pássaro.
Quem sabe? – Espelho, Cotovia, ou a desconhecida
palavra Amor.


Somente sei que minha vida estremeceria, que

os braços sonâmbulos

iriam para o alto e queimariam a ligeira

noite de Junho, ou que o meu

coração ficaria profundamente louco. E nessa

loucura

cada coisa tomaria seu próprio nome e espírito,

e cada nome seria iluminado

por todos os outros nomes da terra, e tudo

arderia num só fogo, entre o espaço violento

do mês de primavera e a terra

baixa e magnífica.




Herberto Helder
A Colher na Boca



domingo, 31 de maio de 2009

Espinosa

Há já algum tempo que a minha curiosidade pedia que visse qualquer coisa de Espinosa.
Este filósofo judeu, cuja familia era oriunda de Vidigueira, era sucessivamente apontado como uma referência mundial na filosofia, e não apenas pelo nosso estranho patriotismo.
E assim, eu, que por acaso nem tenho um especial gosto pela filosofia(ou a memória do liceu mo garantia), dei comigo a ler com gosto um livrinho da colecção Cadernos Culturais, dedicado a este filósofo, da autoria de E. Chartier.
A cada passo tropeçava num pensamento e pensava "isto é importante", e agora, que terminei este livrinho, ficou aquela sensação que me fica muitas vezes, de que deixei perder muito do que li, ou seja, a filosofia de Espinosa merece um olhar mais atento, mais lento, para que a informação não seja apenas informação, mas se entranhe em conhecimento.
Deixo-vos algumas linhas para aguçar o apetite. Garanto que a leitura vale mesmo a pena.
Até breve.
(...)"É, pois, impossível ao indivíduo mutilar a sua própria natureza e encontrar qualquer razão para viver exterior a essa mesma natureza; porque a razão de viver e a vontade de viver mais não são, em qualquer ser, a sua própria essência, enquanto esta exclui de si mesma tudo o que a nega. Em vão procuraremos desejar qualquer coisa que nos seja exterior e a que chamenos a felicidade, o bem ou a virtude: ninguém deseja ser feliz, agir bem, viver segundo a virtude, sem desejar ao mesmo tempo ser, agir e viver, isto é, existir em acto. Antes de desejar qualquer coisa, desejo ser."(....)