Terminei hoje a leitura de um livro, "Ecologia e Ideologia", da colecção Mesa Redonda, da editora Livros e Leituras. Com este livro alarguei um pouco os meus horizontes, graças à generosa contribuição de Domingos Moura, Francisco Ferreira, Francisco Nunes Correia, Gonçalo Ribeiro Telles e Viriato Soromenho-Marques. Mais que considerações pessoais acerca de uma das maiores preocupações da nossa era deixo uma passagem de Nunes Correia, na forma de conclusão:" Julgo ser sempre necessário falar de ideologia com um grande sentido de responsabilidade. As ideologias salvam e redimem, mas as ideologias também oprimem e destroem. As ideologias procuram sempre mudar o mundo, para o melhor ou para o pior, mas acabam sempre por gerar algo distinto daquilo que se propõem. Em rigor não mudam o mundo, apenas justificam ou caucionam todas as mudanças no mundo.
É proverbial falar-se da crise das ideologias nas sociedades contemporâneas. Crise de valores, talvez fosse preferível chamar-lhe. E essa crise abre um vazio que tende a ser preenchido pelas formas mais espúrias de messianismo redentor, nas suas facetas mais bucólicas ou mais belicistas. A síndrome do milénio gera inquietações e angústias. Julgo que a ecologia é importante demais, e devia ser racional demais, para preencher esse lugar mítico de uma qualquer redenção salvífica.
A crise das ideologias tem provavelmente de se resolver com outras ideologias. E as novas ideologias, nas sociedades contemporâneas, têm necessáriamente de assimilar importantes valores ecológicos. Mas a ecologia não pode substituir-se à ideologia ou erigir-se em seu sucedâneo. A ecologia é, decerto uma componente importante da relação das sociedades humanas contemporâneas entre si e com o mundo que as rodeia, mas não é definitivamente a totalidade dessa relação nem o seu princípio organizador.
Incansavelmente temos de construir sociedades mais democráticas, mais participativas, mais responsáveis. Sociedades sempre imperfeitas porque são humanas e, porque são humanas, sempre em aperfeiçoamento. Incansavelmente temos de contrariar a subjugação a uma qualquer "ordem natural" , conceito afim de subjugação a uma qualquer "ordem superior" que corre o risco de se transformar rapidamente em subjugação à "superioridade de uma ordem".
Para os crentes a única ordem superior que merece reconhecimento é a divina. E essa devolveu ao homem (sua imagem e semelhança!) a liberdade de traçar o seu destino. Para os não crentes a única ordem superior que deve ser obedecida é a infindável tarefa de tornar as sociedades humanas mais justas e mais felizes.
Penso, assim, que inscrever a ecologia no lugar da política ou da ideologia é desaconselhável e mesmo perigoso. Antes é preciso conduzir a política ao lugar da ecologia."(.....)