Havia um menino
que tinha um chapéu
para pôr na cabeça
por causa do sol.
Em vez de um gatinho
tinha um caracol
tinha o caracol
dentro do chapéu;
fazia-lhe cócegas
no alto da cabeça.
Por isso ele andava
depressa, depressa
p´ra ver se chegava
a casa e tirava
o tal caracol
do chapéu, saindo
de lá e caindo
o tal caracol.
Mas, era, afinal
impossível tal,
nem fazia mal
nem vê-lo, nem tê-lo:
porque o caracol
era de cabelo.
Poema de Fernando Pessoa dedicado a uma criança que detestava usar chapéu.
quinta-feira, 5 de julho de 2012
terça-feira, 3 de julho de 2012
Noite
A nau de um deles tinha-se perdido
No mar indefenido.
O segundo pediu licença ao Rei
De, na fé e na lei
Da descoberta, ir em procura
Do irmão no mar sem fim e a névoa escura.
Tempo foi. Nem primeiro nem segundo
Volveu do fim profundo
Do mar ignoto à pátria por quem dera
O enigma que fizera.
Então o terceiro a El-Rei rogou
Licença de os buscar, e El-Rei negou.
*
Como a um cativo, o ouvem a passar
Os servos do solar.
E, quando o vêem , vêem a figura
Da febre e da amargura,
Com fixos olhos rasos de ânsia
Fitando a proibida azul distância.
*
Senhor, os dois irmãos do nosso nome
O Poder e o Renome -
Ambos se foram pelo mar da idade
À tua eternidade;
E com eles de nós se foi
O que faz a alma poder ser de heroi
Queremos ir buscá-los, desta vil
Nossa prisão servil:
É a busca de quem somos, na distância
De nós; e, em febre de ânsia,
A Deus as mãos alçamos.
Mas Deus não dá licença que partamos.
Fernando Pessoa, Mensagem
A nau de um deles tinha-se perdido
No mar indefenido.
O segundo pediu licença ao Rei
De, na fé e na lei
Da descoberta, ir em procura
Do irmão no mar sem fim e a névoa escura.
Tempo foi. Nem primeiro nem segundo
Volveu do fim profundo
Do mar ignoto à pátria por quem dera
O enigma que fizera.
Então o terceiro a El-Rei rogou
Licença de os buscar, e El-Rei negou.
*
Como a um cativo, o ouvem a passar
Os servos do solar.
E, quando o vêem , vêem a figura
Da febre e da amargura,
Com fixos olhos rasos de ânsia
Fitando a proibida azul distância.
*
Senhor, os dois irmãos do nosso nome
O Poder e o Renome -
Ambos se foram pelo mar da idade
À tua eternidade;
E com eles de nós se foi
O que faz a alma poder ser de heroi
Queremos ir buscá-los, desta vil
Nossa prisão servil:
É a busca de quem somos, na distância
De nós; e, em febre de ânsia,
A Deus as mãos alçamos.
Mas Deus não dá licença que partamos.
Fernando Pessoa, Mensagem
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