quinta-feira, 21 de maio de 2009

Um elogio ao Silêncio dos Livros nas palavras de Walter Benjamin


Para quem ainda não conhece, gostaria de vos mostrar este lugar da blogosfera que se chama O Silêncio dos Livros e que considero uma obra de arte. Este nome cai-lhe bem porque o coleccionador não escreve, oculta-se para que melhor vejamos imagens que escandalosamente se dirigem a nós. Ao Miguel, um parágrafo de Rua de Sentido Único de Walter Benjamin.

“Criança Desordenada. Cada pedra que ela encontra, cada flor colhida e cada borboleta apanhada é já para ela o início de uma colecção, e tudo quanto possui forma para ela uma única colecção. Nela, esta paixão mostra o seu verdadeiro rosto, o agudo olhar índio que, nos antiquários, investigadores, bibliómanos, continua a arder, se bem que apenas turvo e maníaco. Mas entra na vida, transforma-se em caçador. Caça os espíritos cujo rasto pressente nas coisas; entre espíritos e coisas, passam-se anos durante os quais o seu campo de visão permanece livre de pessoas. Nela, as coisas passam-se como nos sonhos: não conhece nada que seja constante; as coisas sucedem-lhe, assim julga, vão ao seu encontro, esbarram com ela. Os seus anos de nómada são horas na floresta do sonho. É de lá que arrasta a sua presa até casa, para a limpar, a fixar e desencantar. As suas gavetas têm de se transformar em arsenal e jardim zoológico, museu criminal e cripta. Arrumar seria destruir uma construção repleta de castanhas eriçadas de espinhos que são clavas, papéis de estanho que são um tesouro de pratas, paralelepípedos de madeira que são ataúdes, cactos que são tótemes, e tostões de cobre que são escudos. No armário das roupas da mãe, na biblioteca do pai, já há muito que a criança ajuda, ao passo que no próprio campo, a criança ainda continua a ser o hóspede inconstante e aguerrido.”